quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

A águia e a tartaruga



Ao sopé de uma gigantesca montanha, confabulando amistosamente, estavam a Águia e a Tartaruga. Falavam sobre superar limites, e atingir objetivos. A Águia, poderosa rainha dos ares, dizia não haver lugares inatingíveis, e nem metas que não pudesse alcançar. A envergadura de suas asas permitia que fosse a qualquer lugar. Era soberana e tinha a segurança que apenas tem quem sabe do seu real potencial.

A meiga Tartaruga, a quem a paciência já havia ensinado grandes lições, falava sem pressa. Contava sobre pequenos detalhes que, ao longo de sua caminhada, haviam entrado pelos seus olhos e marcado seu coração.

A Águia, sempre sedenta por aventuras, propôs um desafio à Tartaruga. Subiriam a montanha para, lá do alto, ver o mar. Queria mostrar para sua amiga o tamanho real do mundo. O horizonte visto do alto era de uma beleza ímpar. Empolgada, descreveu o aprendizado que sua alma faminta já assimilara. A Tartaruga, conhecendo a velocidade de seus passos, soube que este desafio muito lhe custaria. Talvez a metade de sua existência. Mas queria ver o que havia lá no alto.

Olharam-se, sorridentes, e começaram sua aventura. O farfalhar das asas da Águia, ergueu poeira e, em instantes, sumiu das vistas da Tartaruga. E esta, movendo-se no ritmo que lhe fora conferido pela vida, foi subindo lentamente. Seu corpanzil pesado tinha muita dificuldade para se mover naquele terreno irregular. Durante o trajeto, muitas vezes tropeçava na falta de experiência e rolava morro abaixo. Mas depois de se refazer, recomeçava a caminhada.

A trilha era estreita e, muitas vezes, ela parava para dar passagem a outros animais, que subiam ou desciam, e sempre gentil, oferecia-lhes seu sorriso.

Alimentava-se da vasta vegetação e seu paladar provou novos sabores. Alguns amargos, mas outros absurdamente tenros e macios. Olhando ao redor, para não perder nenhum detalhe, deu-se conta de que havia flores, ornamentando o caminho, e estas, com seu perfume, derramavam alento dentro de seu coração.

Enquanto a Tartaruga se empenhava em subir, tomando muito cuidado com as quedas, a Águia, há muito já alcançara o topo. Aliás, não demorara quase nada, e agora, no alto de uma frondosa árvore, se perguntava quanto tempo levaria a Tartaruga para vir a ter com ela.

Esperou dias e noites. E aquela paisagem, sempre encantadora, foi tornando-se cansativa, e ela ansiou por sair dali. Precisava alçar vôo, traçar novas metas. Tinha sido tão fácil chegar, e agora se perguntava porque incentivara a pobre Tartaruga a subir. Não seria possível esperar por ela. A vida se agitava dentro das suas veias e estagnar significava matar seu espírito. Morreria, se ficasse. Precisava estar em constante movimento para que suas asas não atrofiassem. Olhou para baixo e nem sinal da Tartaruga. Então, seu piado forte cortou o silêncio, enquanto ela cortava o céu, e voou dali.

Anos mais tarde, completamente exaurida, chegou a Tartaruga ao topo. Durante este tempo todo, enquanto caminhava e quando o cansaço minava as suas forças, era nas palavras da Águia que ela pensava. Veria algo novo. Veria um novo mundo. E este pensamento foi seu alimento. A cada vez que quase sucumbia tentava visualizar aquele horizonte descrito pela Águia, e então, cantarolante, começava tudo outra vez.

Seus passos eram constantes. A subida não lhe conferira uma nova velocidade. Muitas vezes, havia sido muito duro olhar para o alto e ver o quanto ainda faltava. Então, ela olhava para os lados. E olhava atrás de si. E, orgulhosa, constatava que, mesmo que morresse ali, que jamais atingisse seu objetivo, jamais em sua vida havia feito algo igual.

Faltava pouco agora para que conhecesse um mundo novo. Mais alguns arbustos e estaria no topo da montanha. Seu coração batia apressado, seu corpo tremia de ansiedade e excitação. Então, a cortina se abriu. Tudo o que vivera até então não se comparava ao que estava sentindo. Lá estava o horizonte se encontrando com o mar gigante. Ambos se tocavam, numa suave carícia, e o Sol nascia da união dos dois. Vinha saindo, todo matreiro, de dentro do mar e erguia-se sobre a Terra.

Nesta hora, duas lágrimas suaves brotaram dos olhos da Tartaruga. Mentalmente agradeceu à Águia pelo incentivo que lhe dera. Sabia que não a encontraria ali. Sempre soubera. A Águia plantara, dentro dela, um par de asas gigantes. Apostara em sua persistência e, graças a ela, a Tartaruga se tornara única, entre todas as Tartarugas. Com um suspiro emocionado, recolheu-se dentro de seu casco, e dormiu serenamente.

Desconheço a autoria.

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1 comentários:

Avanilda Silva da Cruz Melo disse...

Lindo!Lição de vida.

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É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo. Clarice Lispector
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